O artista

Aldo Beck

Aldo Beck nasceu em Florianópolis no dia 15 de janeiro de 1919, à rua Joinville, hoje Dom Jaime Câmara.

O pai foi Arthur Beck, de Santo Antônio da Patrulha, Rio Grande do Sul e sua mãe, Perpétua N. Beck, nasceu no subdistrito de Tijuquinhas, Santa Catarina.

Seu avô paterno era natural da Província de Gerona, na Espanha e sua avó também paterna, nasceu em Cuba.

Os avós matemos eram distantes descendentes de portugueses.

A infância de Aldo transcorreu entre seus 8 irmãos e as crianças da antiga rua Joinville, em Florianópolis. A irmandade era constituída por: Abelardo, Alberto, Álvaro (já falecido), Armando, Avani, Arno, Adir, e Arina que, juntamente com Aldo, somavam 9 filhos de seu Arthur e dona Perpétua.

Desde criança gostava da arte pictórica e vivia desenhando. Seus presentes de aniversário eram estojos de aquarela e, na escola primária, executava constantemente desenhos que as professoras solicitavam para as aulas. Nunca esquece as palavras amigas e elogiosas da professora Emília Boos e de outras, que estimulavam o seu já marcante gosto artístico. Há uma passagem da sua meninice recordada com sorrisos. Foi aquela que se deu ao visitar o humilde atelier do pintor catarinense Eduardo Dias, amigo de seu pai, quando o artista lhe disse para pintar, pois que tinha pendores para tanto. Aldo Beck, tímido como sempre foi uma característica sua, disse não possuir tintas à óleo e o bom velhinho falou-lhe com energia: "Meu filho, até com excremento de passarinho pode-se pintar, quando se tem vontade!" Mas foi somente em 1947 que iniciou com mais coragem a arte pictórica. Muitas coisas talvez o tenham influenciado então. Quem sabe se as saudades prementes dos seus e da sua tão querida Florianópolis, pois nessa época morava em Tubarão.... Houve ocasião que, acossado por críticas destrutivas, interrompeu sua arte por quase quatro anos. Tímido por natureza, fechou-se tristemente numa inatividade desanimadora. A vinda do pintor gaúcho Joel Amaral com sua família, ao bairro do Bom Abrigo, foi como uma alavanca impulsionante na vida de Aldo. Daí para cá vem se dedicando ininterruptamente à arte, embora bem pouco seja o tempo de que dispõe para tal.

Aldo Beck casou-se com Helena Balkis Bittencourt, em Tubarão, a 18 setembro de 1947, tendo as cerimônias civil e religiosa se realizado na antiga igreja católica da cidade. Sua esposa nasceu em Tubarão, a 10 de dezembro de 1926, filha de Jeronymo Bittencourt e Apolônia de Souza Bittencourt.

A 12 de maio de 1949 nasceu em Tubarão a primeira filha do casal, de nome Adiene Beck (hoje casada com Luiz Pessoa Guimarães), na maternidade Nossa Senhora Conceição.

A 29 de setembro de 1952 nasceu, em Florianópolis, o segundo e último filho, Arthur Beck Neto, na Maternidade São Sebastião.

A profissão de Aldo foi a de Desenhista Técnico Especializado, tendo trabalhado:


Fatos sobre a vida do artista Aldo Beck


Ao precisar dos serviços de certo marceneiro, rapaz simples e prestativo, Aldo admirou-se ao ver, entre pó e serragem, telas de vários pintores na modesta oficina marcenaria. Soube que os quadros vieram parar às mãos de uma parente do marceneiro, que desconhecia o valor dos mesmos. Aldo sentiu que, se oferecesse uns poucos cruzeiros por eles, o marceneiro os venderia de imediato. Mas não agiu assim, procurando fazê-lo entender o valor dos quadros e até levou dois deles para sua casa, limpando cuidadosamente e devolvendo-os depois ao marceneiro recomendando-lhe os cuidados a tomar daí por diante. Mais tarde soube que ele havia vendido o maior e melhor por exatamente cinco cruzeiros novos a um rico freguês de móveis. Cabe salientar o cuidado, o carinho, a reverência que Aldo dispensou àqueles quadros e, mesmo desejando possuí-los, o que poderia fazê-lo por uma quantia ínfima, pois jamais teria o necessário para comprá-los pelo que realmente valiam, não quis conspurcar sua consciência realizando um negócio que lesaria ao mais pobre.

Além da arte pictórica, Aldo Beck possui também o dom especial para cativar e fazer amizade com as crianças. Nos ônibus, nas ruas, em todos os lugares há sempre pequeninos a lhe fazerem festa. No seu aniversário o número de crianças é tão grande que ao chegar alguém que não o conheça, vai logo perguntar qual é a criança aniversariante. E nunca se sabe, entre ele e os pequenos, aquele que fica mais feliz. Às vezes ele fica atrapalhado, pois há sempre um índio, mapa, Duque de Caxias, Osório, etc, para desenhar em capas de trabalhos escolares...

Jamais Aldo cobrou alguma importância por desenhos de plantas de casas humildes, onde seus moradores pedem requerimento de posse da terra ou usucapião. Assim também procede quanto a plantas de templos de qualquer credo.

Uma das pessoas de Florianópolis que mais impressionou a Aldo Beck foi, sem dúvida, o professor Henrique da Silva Fontes. Ainda menino, já encontrava a presença capacidade intelectual de Henrique da Silva Fontes, que se preocupava em fazer despontar na criança catarinense a luz do entendimento. Esse professor teve parte muito grande desenvolvimento intelectual das crianças, dos jovens e dos adultos de Santa Catarina. No primário, lá estavam os livros organizados por esse admirável homem, que ia buscar um pouco em Rui Barbosa, Olavo Bilac e até mesmo na Bíblia subsídios para ensinar crianças. Não se pode ignorar, fala Aldo, a presença marcante desse homem dinâmico frente da Faculdade de Filosofia de Santa Catarina. Acompanhou seu desenvolvimento, sua construção, tudo enfim, concernente àquele empreendimento, educacional.

Quantos desenhos e aquarelas Aldo Beck executou com satisfação para a administração do professor Fontes! E o professor jamais permitiu que fossem encomendados desenhos ou aquarelas a outros de fora de Santa Catarina, pois afirmava que aqui haviam valores que mereciam a mais elevada consideração. Uma das coisas que Aldo achava interessante na personalidade do professor Fontes é que ele detestava falar com alguém ao telefone; exigia a presença de operários, funcionários, engenheiros, etc. porque queria ver-lhes os olhos. Certo dia o professor falou que, ao ser terminada a construção Faculdade de Filosofia, colocaria na placa da mesma, além de outros, o nome do operário chefe de obras. Assim falou, assim o fez.

Nunca será demasiado dizer do amor imenso que Aldo Beck tem por sua Florianópolis.

Com o auxílio de velhas fotos descoloridas e analisadas com lentes, fica horas a fio debruçado sobre seus quadros, extravasando a alma em espontânea chama de bem querer ao que é nosso. É como vê-lo recriar a cidade dos nossos antepassados, transpondo o tempo para mostrar Florianópolis, ou Desterro do passado, com suas casas de sacadas de ferro trabalhado, suas ruas ladeadas de postes com lampiões à querosene, as almofadinhas da época, o comércio, a catedral antiga e original, os carrinhos puxados por cavalos e toda uma nostalgia poético-artística transmitida para a atualidade.


Aldo fala de sua vida a um repórter


"Desde criança sempre gostei de desenhar. Um fato curioso é que em casa todos tinham talento para a pintura, apenas não foram adiante. Toda a família incentivava de uma forma ou de outra, com elogios carinhosos, etc.

Que eu me lembre, sempre nos meus aniversários de criança os meus pais me presenteavam com um estojo de aquarela e o pincel e a palheta eram uma constante em minha vida. Não posso dizer que estudei pintura, mas por prazer mesmo eu frequentava o atelier do pintor Eduardo Dias e ali conversávamos discutíamos e eu assimilava o que podia. Não dá para se dizer que se vivesse em função que se ganhava com a pintura, mas eu me virava. Eu trabalhava em tudo o que surgia; cenários para teatro, cartazes de cinema, proclames... Mas nem sempre foi assim. Vivi uma época da minha vida em que simplesmente não pintei nada, pois assim como existia pessoas capazes de fazer críticas arrasadoras a outrem, existem também pessoas que, determinadas épocas da vida recebem essas críticas como um desestimulo, o que abala totalmente a criatividade; e isso aconteceu comigo, deixando-me sem condições para continuar. Fui ferido na minha sensibilidade, foi completamente desencorajado e questionei muito, pois será que estava fazendo um trabalho que prestasse, mesmo? Aí perdi a vontade e passei a me dedicar exclusivamente ao meu trabalho como funcionário público do DER, onde trabalhei por 25 anos. Mais tarde veio morar aqui perto da gente um pintor gaúcho que viu coisas boas no meu trabalho e me incentivou, me estimulou a recomeçar, todo o meu potencial aflorou. Eu pintava para mim, por prazer, e as pessoas gostavam. Hoje eu reagiria de uma forma completamente diferente. Quem quiser que diga e que ache o que bem entender da minha obra. Na minha idade eu posso me dar ao luxo de dizer que pinto por puro prazer e para minha satisfação própria. E eu não pinto pelo dinheiro. Se pintar 20 quadros ou 50, sei que vendo todos. Pinto para mim, se alguém quiser eu até vendo, mas não é assim na base da produção para sobreviver. Se eu fosse pintar pensando na venda a coisa virava um comércio e aí eu talvez nem tivesse mais aquela vontade de produzir. Com relação aos apelos e até pressão dos marchands, que não são poucos, eu faço o que posso; tem dia que pego um quadro e o termino; faço o possível para atender a todos, mas não me violento. Quando vejo que a produção está atrapalhando as minhas pesquisas, tirando muito do meu tempo, eu paro. E isto eu fiz quando estava trabalhando em um projeto da memória florianopolitana, quando me dediquei exclusivamente pesquisar as formas de evolução da cidade de Florianópolis. Passei horas pelas bibliotecas acervos particulares, procurando e documentando dados. Ali fui desenhando, sempre procurando manter a maior fidelidade ao sentido do meu trabalho. A partir dessa pesquisa elaborei um trabalho em desenho e depois passei para a tela uma Florianópolis desde seus primeiros momentos até os dias de hoje. Além dos planos para manter todos os trabalhos juntos como um documentário de nossa história, há a vontade de editar um livro onde o público teria acesso mais fácil a esse documento visual. Essa pesquisa eu iniciei muitos anos atrás e quando o professor Rodrigues Cabral vivia ele foi de grande valia para o trabalho, inclusive pesquisamos como teria sido construída a nossa primeira Catedral Juntos chegamos à conclusão de que era coberta de palha, mais adiante foi recebendo melhorias, teve inúmeras etapas, até chegar a esta salada arquitetônica de hoje. Procuro retratar através de fotos antigas e estudos os prédios públicos e suas várias transformações, pois acho que o pintor deve ser um pouco historiador.

Eu acompanho os fatos, não sou absolutamente contra o progresso, mesmo porque ele é inevitável, mas o que seria de um povo que não conservasse seus costumes que não preservasse sua identidade? Sou de opinião que em benefício dos modernismos o antigo não deveria ser inteiramente sacrificado. Uma boa parte da cidade deveria poupada. Eu ando por aí desenhando tudo com muita fúria, com medo de que no dia seguinte aquilo tenha desabado. Eu chego a me sentir um pouco responsável pela memória das nossas coisas. Trabalho em cima do que ainda resta. Por exemplo, ali na praça perto do BESC ainda existem umas casinhas; eu já as pintei de todos os ângulos possíveis, o mesmo acontecendo com o mercado, que só ainda não pintei de cima de um helicóptero.

Já no que diz respeito às restaurações, nem posso pensar! A igreja do Ribeirão perdeu toda a sua característica, e ousaram chamar aquilo de restauração! O que aconteceu lá foi uma reforma. A nossa própria Catedral tem sido violentada, a memória do povo não é tão curta assim que não dê para lembrar que ela tinha paredes e colunas pintadas por verdadeiros artistas! Eu gostei da última restauração que fizeram no Palácio Cruz e Souza.

Mais tarde vou pensar e ver o que tenho para mostrar ao público, digo mostrar minha obra no seu todo. Para falar a verdade não gosto muito de exposições, porque isso me ataca muito o sistema nervoso, toda aquela expectativa, todo aquele trabalho organização e montagem...

Eu recebo muitos convites para exposições de outros artistas e procuro ir sempre. Já dos movimentos culturais eu procurei me afastar, não tenho envolvimento nenhum. No MASC não tenho ido atualmente; na Alfândega, se acontece alguma coisa, acho que não fariam uma exposição dos meus trabalhos, talvez não aceitem o meu estilo não sei. Se bem que eles nunca convidaram o Zumblick para uma exposição, mas ele veio, fez a exposição e simplesmente aquela casa nunca recebeu um público assim, foi um sucesso. O critério deles nem sempre é o que o público consagra. Já esse pessoal novo, de vanguarda, eu gosto, eu aprecio a arte de maneira ampla, não me prendo a escolas, nem a estilos, nem a fases. Aprecio os pintores tradicionais, mas vibro com coisas novas, sou aberto. Eu adoro a Vera Sabino, gosto muito da pintura do Pléticos, o Átila também procura fazer um trabalho histórico. Eu gostava muito do D´Ávila, que faleceu, e gosto de muitos outros. Se algum não me convida e eu fico sabendo que tem exposição, eu vou olhar, e muitas vezes eles vêm me agradecer a presença. Sabe, eu já passei da idade de ter raivinha, de boicotes e coisas do gênero. Me dou bem com todo esse pessoal das galerias, pudera ter mais trabalhos para atendê-los sempre! Mas o que eu gosto mesmo é quando recebo pessoas interessadas em conhecer o meu trabalho. Elas vêm aqui e olham, a gente conversa, deste contato eu gosto muito. A pessoa compra um trabalho meu, fica me conhecendo, e eu a ela, e volta vez ou outra para visitar e nem sempre para comprar. Isso é ótimo. E se alguém me perguntar se essas visitas atrapalham o meu ritmo de trabalho, posso responder que não, absolutamente, pois eu tenho todo o tempo do mundo em se tratando de pessoas. Não considero que conversar com alguém que se interesse por minhas obras seja uma perda de tempo, pelo contrário, me dá uma alegria e prazer muito grandes.

Certa vez me perguntaram se eu daria "dicas" para novos artistas. Meu Dei quem se negaria a tirar dúvidas ou orientar alguém que tenha alguma coisa em comum com a arte da gente e a ela queira se dedicar? Eu não sei se teria dicas para dar, mas quando pedem minha opinião, sempre estou pronto para dar. E sempre com estímulo, procurando ver o que aquele trabalho tem de bom e, caso contrário, com muita sutileza, fazer ver o que não está de acordo.

E assim vou vivendo, realizando meus estudos, pois pinto a partir de um estudo desenhado e muito bem detalhado. Meu trabalho é extremamente fiel, eu não fico inventando detalhes. Sem falar que o florianopolitano é bastante bairrista, escolhe temas prefere comprar cenas da nossa cidade e, depois, é que vai pensar em adquirir, por exemplo casarios de Minas Gerais. E é por isso que friso que a fidelidade na execução da obra é fundamental, tem-se que adquirir credibilidade junto ao cliente. Eu retrato a parte física cidade como ela é ou foi, eu não fico imaginando coisas e colocando na tela. Mas também pintei os nossos costumes e a nossa cultura, como o quadro do oleiro de São José. Quanto a retratos, eu não gosto de fazer; tenho um temperamento muito perfeccionista. Um amigo artista já me disse certa vez: ´Tu não deves caprichar e te matar tanto para fazer um retrato a obra não precisa ficar tão parecida com a pessoa, o que vale é o teu trabalho'. Mas eu não me conformaria nem me sentiria à vontade em retratar alguém que não fosse imediatamente reconhecido na tela.

A minha oportunidade comercial aconteceu depois que eu já havia participado de algumas exposições e do Salão de Artes Plásticas em São Paulo. Quem me promoveu mesmo em Florianópolis e incentivou muito foi o Márcio Collaço, quando Presidente Clube Doze, organizando lá movimentadas exposições, todas com sucesso de público e vendas. Mas o sucesso, mesmo, atribuo a alguns fatos. Primeiro, à evolução do meu trabalho, ao resultado de minhas pesquisas, ao valor e ao reconhecimento do público que também pensa em preservar a memória cultural da cidade. Penso ainda que meus quadros devem atrair pessoas saudosistas, que viveram felizes na época em que a cidade tinha outra cara e, olhar para estes quadros, agora, pode reporta-los àquela determinada época de suas vidas que, de uma maneira ou de outra, lhes traga alguma lembrança. Quanto ao sucesso de vendas, creio que o Plano Cruzado tenha sido o grande responsável, pois fez com que todo o mundo tirasse suas economias da poupança e fosse investir em outra coisa como nas artes. Não sei se foi o auge, teve época em que pintei mais, mas desde aí, reconheço que procura vem sendo grande. E veja, eu não queria tudo isso, não. Eu gostaria até de ter mais calma e, decorrente disso, mais tempo para me dedicar às pesquisas, das quais já falei. Nessa altura da minha vida o dinheiro não faz a menor diferença; estou aposentado e o que ganho dá para viver dentro dos meus padrões, completamente independente de venda quadros. Vivo com minha senhora muito bem. Eu podendo trabalhar num ambiente limpo e ordeiro já me faz feliz, porque conviver com bagunça me desagrada. Há bem pouco tempo esteve na minha casa outro amigo pintor e, achando graça do ambiente de trabalho, falou: 'Mas assim não dá, tu és muito organizado, isso aqui é muito perfumado, muito arrumadinho'. “Na verdade, minha senhora, cuida e eu não gosto de jogar as coisas para cima, nem para o chão. Não faço o gênero de pintor intelectualizado, boêmio, nem tenho vícios. Sou um cidadão comum, de gostos simples, que vive para sua família e hoje com tempo suficiente para retratar a minha cidade".

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